Categoria em Crítica Literária | Cartas

Orlando Castro lança debate sobre a Angola contemporânea

Orlando Castro lança debate sobre a Angola contemporânea

Resumo da resenha ao livro Eu e a UNITA, publicada a 19 de Fevereiro de 2025, no jornal Folha 8.

Ver texto original aqui: https://jornalf8.net/2025/em-qualquer-parte-do-mundo/

O jornalista e escritor luso-angolano Orlando Castro autor do livro “Eu e a UNITA”, disponível nas principais plataformas digitais em versão EPUB, e na versão em papel nas livrarias da FNAC e em www.AUTORES.club. A obra é um relato visceral e crítico sobre a história e a situação atual da República de Angola, reunindo depoimentos e análises contundentes sobre os caminhos trilhados pelo país desde a independência.

Uma obra que une História, Política e sentimento

No livro, Orlando Castro mescla memórias pessoais e uma análise crítica do percurso político da república. Nascido e formado no Huambo – berço da sua identidade – o autor revela como a paixão pela sua pátria se transformou em desilusão diante do que descreve como um sistema marcado pela corrupção e pelo autoritarismo. Segundo Orlando Castro, enquanto o MPLA mantém um poder absoluto e implacável, a UNITA, desde a morte de Jonas Savimbi, enfrenta desafios internos que a impedem de se afirmar como uma verdadeira alternativa.

Depoimentos que iluminam contradições

O jornal Folha 8 traz os testemunhos de quatro leitores que, cada um à sua maneira, ressaltam a importância e o impacto da obra. Conheça mais sobre eles:

Paulo de Morais – Académico e ativista contra a corrupção

Professor universitário português e ex-vice-reitor da Universidade do PortoPaulo de Morais é um dos mais destacados ativistas contra a corrupção em Portugal e nos países lusófonos. Foi candidato à Presidência da República Portuguesa em 2016 e tem sido uma voz crítica contra o abuso de poder e o enriquecimento ilícito de elites políticas. No seu depoimento, destaca como o livro de Orlando Castro expõe as duras realidades da República de Angola, da pobreza extrema ao alarmante índice de mortalidade infantil, e denuncia a cleptocracia que se instalou no país.

Malundo Kudiqueba – Jornalista e analista político

Malundo Kudiqueba é um jornalista e analista político angolano, especializado na cobertura de movimentos políticos em África. Com uma carreira voltada para a investigação e análise dos principais partidos políticos angolanos, Kudiqueba é conhecido por suas avaliações incisivas sobre a evolução da UNITA e do MPLA. No seu testemunho, critica a postura autoritária dos atuais líderes da UNITA, especialmente a decisão de Adalberto Costa Júnior de restringir o acesso dos militantes à leitura do livro, simbolizando um desvio dos ideais originais do partido.

Osvaldo Franque Buela – Escritor e ativista pan-africanista

Natural da República do CongoOsvaldo Franque Buela é um escritor e ativista pan-africanista, amplamente reconhecido pela defesa da soberania africana e dos direitos humanos. É autor de vários ensaios sobre a política e os desafios do continente africano, tendo colaborado com diversos movimentos independentistas. Na sua análise, vislumbra na narrativa de Orlando Castro uma ponte entre o passado bélico e a atual desordem política, destacando a coragem do autor ao expor as divisões internas da UNITA e o esgotamento moral do MPLA.

Eugénio Costa Almeida – Investigador e especialista em relações internacionais

Lobitanga radicado em PortugalEugénio Costa Almeida é doutorado em Relações Internacionais e especialista em geopolítica africana. Pesquisador associado a diversas instituições académicas, é autor de artigos e livros sobre política e economia em Angola. No seu testemunho, ressalta a força da escrita de Orlando Castro, que utiliza a obra para revisitar e resgatar momentos históricos muitas vezes esquecidos, convidando o leitor a refletir sobre a identidade e os rumos da República.

Reflexões e desafios para o futuro

Mais do que um simples relato histórico, Eu e a UNITA propõe uma profunda reflexão sobre as raízes dos conflitos e das disparidades sociais em Angola. Ao denunciar o domínio do poder e as cúmplices relações entre elites angolanas e grupos económicos internacionais, o livro torna-se uma ferramenta essencial para quem deseja compreender não só os desafios políticos, mas também as consequências humanitárias de um sistema que privilegia muito poucos em detrimento da maioria.

Enquanto o autor reafirma a sua paixão inabalável pela terra natal, o livro também evidencia o descompasso entre os ideais que impulsionaram a Luta de Libertação pela independência e a realidade atual, marcada pela pobreza e pela exclusão social. Num cenário onde a crítica se faz necessária para a transformação, Eu e a UNITA emerge como uma chamada à reflexão e, possivelmente, à reconstrução dos alicerces de uma República de Angola mais justa e democrática.

 Rui Verde (Lusotopie): O processo dos 15+2

 Rui Verde (Lusotopie): O processo dos 15+2

O artigo do jurista e académico Rui Verde, publicado na Lusotopie, analisa o livro “Prisão Política” de Sedrick de Carvalho, que narra a prisão de 15 ativistas angolanos pelo regime de José Eduardo dos Santos entre 2015 e 2016. Rui Verde destaca a incompetência do regime, evidenciada pelas acusações infundadas e processos judiciais arbitrários. A obra expõe as torturas físicas e psicológicas sofridas pelos presos políticos, e critica o sistema judicial submisso ao poder político.

Para mais detalhes, veja o artigo completo aqui.

Prisão Política
Prisão Política

Carta de Carlos Ferreira a “um Homem livre”

Carta de Carlos Ferreira a “um Homem livre”

Autor: CARLOS FERREIRA

Li o livro (E agora quem avança somos nós – Romance) de um só jorro. Como dá a sensação que ele foi escrito. Sem paragens, sem grandes interrogações, como se tudo já estivesse na tua cabeça quando o começaste. E dado que a tua escrita tem uma carga coloquial muito grande, é difícil parar quando se começa a ler. Algumas das minhas impressões correm o risco de ter alguma dose de subjectividade por te conhecer e por termos uma ligação grande e antiga, mas não me parece. Procurei ser o mais objectivo possível, mesmo que haja passagens que por esta ou aquela razão me tocam mais do ponto de vista emocional.
É comum, para quem como eu defende há muito tempo, provavelmente desde que ganhei alguma consciência, que as vivências do Autor, o seu caminho, as suas escolhas, o seu perfil humano e o seu posicionamento político são inseparáveis do que escreve. Nunca vi a literatura como algo inocente, mesmo quando aparecem algumas e alguns autores que se auto-definem como “apolíticos”. Uma aberração de uma direita descomposta, pouco democrática e normalmente reaccionária e conservadora. Lembrei-me agora, por exemplo do João Gaspar Simões, que a elite intelectual portuguesa ligada à direita, considerava como um grande crítico literário… E que ecoava normalmente o vazio que o “sal e azar” tanto apreciava. Mas continuemos.
Os teus romances, porque não podiam ser outra coisa. Demonstram claramente uma continuidade do que foste sendo ao longo da vida, enquanto militante da causa maior da libertação humana, de combatente contra muros e ameias, contra totalitarismos de qualquer espécie, sem cedências e sem contemplações. Lembrando a Mafalda do Quino, podíamos dizer não “Hay gobierno soy contra” mas “Há repressão, sou contra”. Seja a repressão efectiva, directa, de poderes legal ou ilegalmente constituídos sobre cidadãs e cidadãos, sejam os mecanismos psicológicos que com séculos de dominação, propaganda, por via do ensino, da comunicação social, de instituições pseudo-religiosas que são criminosas, e mais recentemente das televisões, das redes sociais e dos “influenciadores”. Que se inculcam na mente das pessoas, ferindo-as, magoando-as, envenenando-as, ao ponto de se submeterem à escravidão mais execrável. A de abandonarem o pensamento livre, autónomo e resultado das nossas escolhas conscientes de seres humanos maduros e pensantes.
Também este romance não foge a essa regra. E é um espelho fiel e sequente do que vens vivendo. Há uma lógica que acompanha a tua ficção que, como é natural, é o fruto das tuas experiências, vivências, vitórias, derrotas – a maior parte das vezes porque a esmagadora maioria dos factos que nos rodeiam e dos humanos que pululam à nossa volta asfixiam-nos a vida inteira e não deixam sequer, de muitas formas, que possamos atingir os outros mais rápida e imediatamente. Que seja.
O manancial de vidas vividas, de amizades conquistadas, de pontes construídas nos mais distantes pontos geográficos do mundo, solidariedades e cumplicidades criadas são-no em suficiente número e consistência para que haja a plena consciência que estás do lado da razão. E que assim sendo, o aumento substancial e agora de peito aberto de barões e marqueses nascidos da lumpenagem, fascistas e pseudo-fascistas, “libertadores” que apenas queriam copiar opressores, nada nem ninguém te fará mudar de opinião e de posição enquanto escreveres, enquanto deres aulas, enquanto estudares, enquanto reflectires, enquanto debateres.
É um romance do mundo porque tu és um Homem do Mundo. Não dos que se fecham à volta do umbigo, olhando-se para o espelho e pervertendo a verdade, matando a esperança, tolhendo a alegria de viver. Condensas neste novo título um sem número de acontecimentos, lugares, gente livre e soberana que obrigará o leitor ou a leitora a procurar, a buscar, a conhecer, a indagar. E a procurar-se, a buscar-se, a conhecer-se, a indagar-se.
Sem as “identidades” filhas da puta que são organizadas e estimuladas para nos dividirem, para nos separarem, para abrirem um fosso nos que, perante uma luta comum, se dividem com os cantos das sereias que os convidam a pensar em primeiro lugar na sua condição individual e de grupo, de classe, de género, de raça e tudo mais quanto vão inventando, enfraquecendo e fazendo esquecer o combate essencial e cada vez mais urgente que devia congregar tudo e todos.
Na discussão que há séculos se levanta sobre o papel do escritor, do autor, do criador, que bem maior pode haver do que este: abrir caminhos, obrigar a que os olhos se regalem com cada “curva” que fazes nas escolhas que vais oferecendo, na criatividade encontrada pelos kilómetros sem fim que percorreste, pelas realidades porque passaste, pelas solidariedades criadas, pelos sofrimentos que te marcam o lombo, em busca afinal de uma das maiores e mais sólidas buscas na Vida: ser um Homem livre. A única condição possível para solidariamente mostrar o caminho da liberdade plena e total aos outros.


* Carlos Ferreira nasceu em Luanda. Jornalista, foi director de Programas da Rádio Nacional de Angola, do semanário Novo Jornal e fez acessoria de imprensa ao Presidente da Republica de Angola até 1995. Premiado várias vezes, como letrista de canções, é poeta com mais de uma dezena de títulos publicados, novelista e cronista. É membro da União dos Escritores Angolanos, da União dos Jornalistas Angolanos, da Associação Tchiweka de Documentação e da Ordem Nacional dos Escritores do Brasil.

Carlos Ferreira (Cassé) — Fotografia Jornal de Angola

** Este artigo foi publicado na Conversa à Sombra da Mulemba