O jurista José Paquete d’Alva Teixeira lançou, a 7 de Dezembro de 2021, no Centro Cultural Português o livro “Código do Trabalho Anotado” (Ed. 2021), pelo jurista e investigador Jonas Gentil.
No deserto chamado Lisboa, para o João Ricardo Rodrigues, navegador
Por FERNANDO DA GLÓRIA DIAS (Braga, 11/11/21)
Fui lá, no deserto chamado Lisboa
e cheguei completo mais completo ainda quando saí, meus bolsos atulhados, não tens emenda Nandinho, menino de sempre,
tomei cacilheiro no cais do Sodré entrei pela penumbra na rápida derrota de Cacilhas, na outra margem das eras, vinha de volta a casa sem saber aonde trazia passado de candonga, minha camanga de brilhos lossengas pequeninas, luboias maiores mas de fingir, mais gostosas e quentes na alma dos tempos, remexi nos bolsos, tanta coisa!, brinquedos inteiros, o jogo da macaca, touradas de morte, a caça ao índio e eu era o índio, gajajas madurinhas, poemas, escola oito, meu primo Zé Maria, o canivete que deu tio Fernando, e meu tio Fernando Nandinho não andes descalço, Nandinho isso não se diz, isso não se faz, fecha a geleira Nandinho, e o embondeiro da estrada do Dondo dizendo amanhã, o cacilheiro rumando a Cacilhas por mil vezes que o tomei de um só trago amargado por ausências de cheiros e cores, cadê a terra vermelha, o rubro das acácias e buganvílias cadê o óleo de palma recendendo e as mangas e goiabas, tudo em meus bolsos, as perguntas e as respostas, que vou remexendo com meus dedos pequenitos, ai Nandinho essas unhas!
Aqui por perto apanhei numa tarde o paquete Quanza da Companhia Colonial de Navegação, largara amarras, soava o apito da despedida por três vezes aparvoando gaivotas desocupadas pelos ares. No deque da terceira classe olhava a gare do cais de Alcântara com chuvinha de cajueiro esbatendo a imagem de meus pais sob uma sombrinha vermelha carregada de acenos, eu regressava a Luanda e eles viriam após e os acenos era assim felizes, brilhavam também, tudo isso em meu bolso, na minha praia morena, no meu Sul, na minha duna, em meu deserto.
Agora, no cacilheiro cruzando o Tejo retomo a tarde de hoje acabada entre acepipes na vasta sala de pé alto do Museu de Arte Antiga bastante cheia de gente atenta, brancos com ar de negros resplandecentes, e negros da tribo dos brancos, botara discurso de sapiência com entremeios de risos de humor descontraído um professor catedrático, angolano do Uíge, de Cabinda ao Cunene, médico e investigador de história de Angola com obra publicada em três cartapácios de muitos quilos
Não encontrei monangambas vergados ao peso dos sacos é só para isso que servem, dissera um historiador precipitado que também não estava presente, e afinal botavam também discurso académico, esses monangambas, a voz bem timbrada, nasalada, segura, um bom humor solto aqui e ali despertando quem ouve, palavras sérias de oração desnovelando fios e tramas, na capital que fora de império e escravatura, ali, em Mocambo, onde afinal era proibido falar, que eu mal ouvi, estou surdo, não importa mas acordado e vivo e o momento tem um peso e uma força de padrão deixado como quem planta isso me basta, é quinda de que colho mangas e sorrisos
Depois comoveu ainda o canto em quimbundo onde fora proibido falar, o violoncelo sublinhando a dor da voz de Rosa, uma flor, uma marca, um grito um padrão também, entre paredes tomadas de fotos enormes de negros e negras com perucas brancas e vestes de brancos, tudo porque afinal plantado o padrão na foz do Zaire, para diante navegou um grande navegador
No cacilheiro trago pois toda essa tralha em meus bolsos, passo na prancha para o cais, Cacilhas é um pasmo parado no tempo, que não existe, a noite está fria espero que me venham buscar…
… fico remexendo nos bolsos meus brinquedos, meus sonhos, minha alma minha estória, meus trilhos, esta forma sinuosa de me afirmar pátria, cada vez mais livre, lavra fecunda plantada agora de padrões dos netos da rainha Ginga, que vão acontecendo com uma grande vontade de riso,
Molha uma chuva pequena quando justo chega quem me vem buscar, traz sombrinha vermelha.
RDP ÁFRICA, 2 de Novembro de 2021 — O jornalista António Silva Santos recebeu o Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel para uma grande entrevista de trinta minutos sobre o primeiro volume “Angola: desde antes da sua criação pelos portugueses até ao êxodo destes por nossa criação” (Ed. 2021).
Durante o mês de Outubro e Novembro a História de Angola marcou presença em Portugal.
Os tempos que correm são extraordinariamente exigentes em todos os Países, por inerência das pressões disruptivas impostas pela crise sanitária a toda Humanidade. Contudo, a normalidade da vida vai sendo restaurada nas sociedades onde o zelo e o triunfo da ciência vai levando de vencidas as adversidades provocadas pela infecção vírica pandêmica em curso. Saudamos, humildemente, o povo português e as instituições que o governam, pelos êxitos que vêm demonstrando ao Mundo, também neste âmbito em particular. As breves reflexões de que estamos incumbidos de apresentar a Vossas Excelências, ao abrigo do título desta despretensiosa palestra conciliam-se na sua plenitude, em nossa humilde opinião, com as indicações providas de profunda sabedoria expressas recentemente em ocasiões de solenidades nacionais, pelos Supremos Magistrados das nossas Nações irmanadas pela História, Suas Excelências os Presidentes das Repúblicas de Angola e de Portugal, respectivamente João Manuel Gonçalves Lourenço e Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa, aos quais de forma remota saúdo desta tribuna com a reverência e humildade mais elevadas. Pela pertinência com que reiteradas vezes se têm referido com acrisolada sabedoria esses dois estadistas, sobre as consequências de acontecimentos históricos na realidade hodierna em ambas sociedades, permite-nos citar alguns excertos contidos em recentes pronunciamentos seus, feitos por ocasião de solenidades celebrativas nacionais. Sua Excelência João Manuel Gonçalves Lourenço referiu em maio do corrente ano, no decurso de uma corajosa e redentora comunicação dirigida ao País e enquadrada na evocação de acontecimentos ocorridos no País em 1977, “a História não se apaga; a verdade dos factos deve ser assumida”. Por seu lado, Sua Excelência Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa disse um mês antes, no quadro das celebrações do 47º aniversário da revolução de 25 de Abril de 1974, “é prioritário estudar o passado e nele dissecar tudo, o de bom e de mau” …“as nações irmãs na língua têm sabido julgar um percurso comum olhando para o futuro, ultrapassando séculos de dominação política, económica, social, cultural e humana”.
As reflexões supracitadas estiveram também subjacentes, durante um pouco mais de quarto de século, à realização da investigação científica multicêntrica, pluricontinental, metanalítica e de outras fontes admitidas pela Teoria e Metodologia Gerais do Estudo da História, com o fito de elaboramos a História de Angola e a de Portugal a ela associada. Quisemos enfatizar na narrativa histórica uma perspectiva vernacular e herdada, expurgando os dogmas e outros contaminantes que a inquinaram durante os séculos de obscurantismo instrumental às paixões e doutrinas das autoridades coloniais e da competitividade política inerente à dinâmica e conturbada realidade das últimas quatro décadas e meia do nosso País. Nesse modesto contributo de mais de duas mil e duas centenas de páginas estruturadas em três tomos, estão tratados com muito maior detalhe os conteúdos do tema objecto desta sumária palestra, pelo que este sumário exercício assume uma função propedêutica, por um lado de outros actos relativos à obra, que vão decorrer no decurso deste mês em Portugal e por outro, ao esforço de leitura de Vossas Excelências, materializando as sublimes indicações acima citadas dos dois mais elevados mandatários dos nossos dois Países. Mas, desobrigando-nos da incumbência que recebemos do nosso editor para aqui hoje estarmos, esperamos revelar-vos alguns pequenos detalhes, apurados pela nossa investigação, e sobre os quais não temos conhecimento, que hajam alguma vez sido escritos e disponibilizados para conhecimento dos cientistas sociais e público comum.
Sobre a fundação da Colónia de Angola
O Direito Internacional Público é uma área das ciências jurídicas, que regula os interesses de cada Nação na sua interacção com os das outras Nações. Embora os cultores desse ramo do conhecimento das ciências sociais divirjam entre si sobre a altura em que a Humanidade começou a observá-lo, é quase isento de controvérsia referir que, os territórios do continente africano estiveram dele dissociados, practicamente, até à ocorrência da Conferência de Berlim sobre África ( 1884 – 1885) e a esmagadora maioria dos respectivos povos, permanentemente em conflitos com os forasteiros, estiveram dele desprotegidos até à altura da conquista da soberania dos seus Estados, ocorrida tão tarde, quanto no decurso do terceiro quartel do século XX. Com poucas excepções, e na perspectiva europeia determinada pelos vícios dos tempos, para revisitar uma elegante expressão cunhada por Bernardo de Sá Nogueira de Figueiredo, sucessivamente 1º Barão, Visconde e finalmente Marquês de Sá da Bandeira, no decreto abolicionista da escravatura de 1836, a África sempre pareceu ser um res nullius, até à última década e meia do século XIX, embora o Congresso de Viena de 1814-1815, que tratara de redimensionar os Estados Europeus após o termo das guerras napoleónicas, houvesse já deliberado a cessação do tráfico de escravizados. Na ausência do Direito Internacional Público inclusivo do continente africano, os principais factores globalizantes que determinaram o relacionamento entre a Europa e os continentes africano e americano foram a religião, o comércio, (traduzido essencialmente no tráfico de escravizados), e a vantagem comparativa do domínio da tecnologia da navegação transoceânica de alguns povos euro-ocidentais sobre as práticas culturais abstinentes e em parte supersticiosas, dos povos africanos e americanos, em desafiar a imaginária ira dos presumíveis monstros e graciosas sereias marítimas. Esses factores determinaram a criação da colónia de Angola, primeiro de jure no dia 19 de setembro de 1571 pela corte do Rei D. Sebastião e quatro anos depois, de facto, pela expedição de 600 homens militares e civis, privada e organizada sem dispêndio do tesouro público, pelo escudeiro da corte portuguesa, Paulo Dias de Novais, neto de Bartolomeu Dias, havendo sido este último o português e primeiro navegador europeu, que em 1488 chegara e transpusera o Cabo de Boa Esperança, no ext horemo meridional do continente africano, onde os oceanos atlântico e índico se abraçam. Entre os 8896 versos, das 1102 estrofes que compõem os dez cantos da magistral obra camoniana publicada em 1572, “Os Lusíadas”, os quatro primeiros versos da 13ª estrofe do V Canto, referem o seguinte: Ali o mui grande reino está de Congo, Por nós já convertido à fé de Cristo, Por onde o Zaire passa, claro e longo, Rio pelos antigos nunca visto. Fica estabelecido que, até à data de publicação dessa singular obra épica lusitana, cerca de um século depois de Diogo Cão haver colocado os padrões da sinalética de navegação nas costas dos actuais territórios de Angola e Namíbia, os portugueses ainda não haviam criado Angola, embora os reinos do Congo e de Portugal já houvessem estabelecido relações inter-estados. Na realidade, Angola foi criada de facto, três anos depois da publicação dos lusíadas, a partir dos domínios territoriais meridionais do Congo, em consequência da Carta de Doação emitida em 1571 pelo Rei D. Sebastião em benefício de Paulo Dias de Novais, em virtude de, dentre outros aspectos que o tornaram elegível, haver sido neto de Bartolomeu Dias, cujo feito consistente à data em haver estado na confluência entre os oceanos atlântico e Índico no extremo meridional de África, a corte queria ver recompensado, outorgando um território ao neto deste e seus descendentes. No texto da Carta de Doação há menção explícita da expedição comandada por Bartolomeu Dias e não há há alusão do nome de Diogo Cão nem dos actos que lhe são atribuídos de haver mandado colocar os padrões na costa afroatlântica meridional. Houve também a insolente acrimónia existente na altura entre os missionários da Congregação de Sã Francisco (Franciscanos) e os da Companhia de Jesus (Jesuítas), que não havia permitido estes últimos afirmarem-se e estabelecerem-se em Mbanza Kongo, actualmente Património da Humanidade e na altura capital do Reino/Império do Congo. Nos termos da Carta de Doação, cuja fotocópia do original e respectiva transcrição, realizada a nosso pedido por um digno paleógrafo da faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, fazem parte da nossa modesta obra, o rei estabelecia o objectivo da fundação da colónia, logo no primeiro parágrafo nos seguintes termos: “ vendo e considerando eu quanto convém a serviço de nosso senhor e também ao meu, mandar sujeitar e conquistar o Reino de Angola (se referia ao reino do Ndongo) assim para se nele haver celebrar o culto e ofícios divinos e acrescentar a nossa santa fé católica e promulgar o Santo Evangelho como pelo muito proveito que se seguirá a meus reinos e senhorios e aos naturais deles de se o dito reino de Angola sujeitar e conquistar…” O território objecto de doação estendia-se 35 léguas costeiras à jusante da foz do rio Cuanza e, apenas para exploração de direitos fundiários limitados durante 20 anos, acrescentava-se o que se situava, igualmente na costa, à montante desse ponto até à foz do rio Dande, não havendo sido estabelecidos limites no interior da terra firme. Em homonomia ao antropónimo Ngola predominante da dinastia que reinava o reino do Ndongo que se perspectivava ser conquistado e convertido ao catolicismo, que era ribeirinho do curso médio e inferior do rio Cuanza, a corte lusa concedeu à capitania o topónimo de Angola, pelo qual o território que foi sendo progressivamente ampliado, menos por via das acções de conquista e mais por via das deliberações da Conferência de Berlim sobre África, passou sob administração portuguesa sucessivamente a ser designado Capitania, colónia, província, Estado de Angola e, desde 11 de Novembro de 1975, por República de Angola. Nas discussões prévias à sua criação e realizadas na corte, fora abordada, sem haver obtido consenso na sua adopção entre os eruditos da Mesa da Consciência obediente aos Jesuítas, a concessão ao território do topónimo “Sebaste”, não em homenagem do nome homónimo del Rei em funções e outorgante, mas em homenagem ao soldado de Roma e de Cristo, convertido em mártir da Igreja Católica e posteriormente beatificado com o nome de São Sebastião, que deveria ser, sem também ser consumada, a designação da primeira igreja que o beneficiário da doação era obrigado a edificar no território. Com esta pequena curiosidade quisemos demonstrar que o território esteve na iminência de ser designado capitania de Sebaste, o que, pela lógica anteriormente mencionada, poderia ter dado a designação final anedótica de República do Sebaste. Constata-se que, à data da emissão da doação monárquica em benefício da Paulo Dias de Novais, não havia nenhuma autoridade portuguesa abaixo do Golfo da Guiné e o ponto mais meridional do atlântico onde ela existia era no arquipélago de São Tomé, onde os navegadores lusos João Santareno e Pero Escobar haviam chegado em 1470 e em 1531, a comunidade lusa ali sedentária já havia edificado uma povoação. Conclui-se que D. sebastião tinha doado um território onde não existia o mínimo da sua autoridade, porque os factores globalizantes assim o permitiam, embora muitos súbditos seus, alguns hominizados, estivessem integrados e aceites como concidadãos nas comunidades nativas.
A Batalha de Ambuíla
Ambuíla é um município da província do Uige e da região setentrional de Angola que, as autoridades da administração colonial convencionaram, a seu tempo, designar por Congo Português, em antinomia aos territórios do antigo reino ou império Congo atribuídos à França e à Bélgica. Antes da Independência do País e durante muito tempo, o município era designado de Nova Caipemba. Nesse município de orografia dominada por paisagens de elevadas montanhas e extensas e amplas planícies cortadas e integradas no ciclo hídrico do rio Loge existem muitas grutas, que constituem amplos auditórios naturais incrustados em montanhas rochosas, capazes de abrigar muitas centenas de pessoas e uma delas, a gruta do Nzenzo, é classificada pela organização internacional National 7 wonders, como uma das sete maravilhas turísticas de Angola. Julgamos interessante revelar agora e porque nunca foi referido antes, o facto de ter sido na gruta dos arredores da aldeia do Inga daquele município onde, nos dias 10 a 12 de Março de 1961 se reuniram muitas centenas de homens provenientes de várias províncias de Angola, com o fito de serem instruídos para assumirem as chefias da insurreição generalizada que eclodiu no dia 15 daqueles mês e ano, e que a historiografia portuguesa fez constar, pela sua elevada magnitude, como tendo sido o início do conflito do ultramar português, e embora essa tivesse sido já antecedida por duas sublevações dos nativos de Angola nos dois meses anteriores. Porém, quase exactamente três séculos antes, no dia 29 de outubro de 1665, uma das planícies da várzea do rio Loge nos arredores da aldeia de Nzondo do mesmo município, constituiu o campo da batalha, que opôs mais de uma centena de milhar de efectivos militares comandados pessoalmente pelo rei do Congo em funções nessa altura, D. António I (Muana Malaza) e a força na ordem de dezenas de milhares de efectivos, maioritariamente indígenas compelidos e minoritariamente europeus, em serviço das autoridades coloniais e comandados por Luis Lopes Sequeira. O casus belli fora o abundante cobre do subsolo do planalto do Congo que, as autoridades instaladas em Luanda, sede da minúscula colónia de Angola, necessitavam extrair e exportar para Lisboa, em virtude de nessa altura Portugal haver necessitado desse minério, para suprir as necessidades de 28 anos de guerra, que eclodira após a extinção do domínio de Castela a que estava submetido e a restauração da sua independência em 1640. Enquanto preparavam a Batalha, os círculos emproados com belicismo em Luanda, haviam em vão sido dissuadidos pelo Rei D. Afonso VI para que não declarassem e realizassem a guerra, na base do fundamento e da advertência formais e explícitas, segundo os quais o Congo não era um reino vassalo de Portugal e ambos os soberanos eram católicos e irmanados. Esse facto histórico, consoante nosso humilde entendimento, desagrava sobremaneira Portugal das responsabilidades históricas inerentes às graves consequências que o desfecho da Batalha de Ambuíla suscitou em África. Perante a superioridade tecnológica e de poder de fogo das forças invasoras idas de Luanda, a batalha saldou-se em derrota, decapitação do rei e genocídio das forças defensoras do Congo; contudo, enquanto as autoridades em Luanda se ufanavam da victória, a corte em Lisboa ficava aturdida e muito pesarosa, pois esse acontecimento impunha um comprometimento definitivo sobre a relação existente nessa altura há quase dois séculos entre os dois reinos, pelo que ordenou a realização de solenes cerimónias fúnebres e piedosas missas de sufrágio da alma de D. António I em Luanda, onde a cabeça do finado rei católico foi sepultada em meio de pompas militares, de Estado e religiosas, em Dezembro de 1665, na Ermida da Nazaré. A coroa de prata do Rei católico do Congo D. António I (Muana Malaza), que fora enviada ao Congo, como sinal de reconhecimento pontifício, pelo Papa Inocência X, foi transportada como troféu de guerra para a corte nesta cidade em janeiro de 1666, pelo sobrinho do obstinado governador geral em funções, André Vidal de Negreiros. Ela é uma relevantíssima relíquia, da qual existem imagens e rigorosas descrições da sua natureza que, conviria localizar e cuja exequibilidade da sua devolução a Angola, os dois governos das nossas Nações poderiam incluir no âmbito do seu permanente e excelente relacionamento, para celebrar e exaltar a amizade dos dois povos, expiar a memória dos insubordinados que desobedeceram o rei D. Afonso VI, redimir a História ou a memória dos portugueses e nativos que, se irmanaram antes do triunfo dos ideais que os separaram e galvanizar o rumo comum entrosado, a seguir por Angolanos e Portugueses, agora e no porvir, especialmente quando recentemente foi subscrito em Luanda o acordo geral e multilateral, que visa promover maior mobilidade dos cidadãos membros dos países que compõem a comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A Batalha de Ambuíla não promoveu a conquista do Congo, contudo a fragilização deste reino foi tão determinante para prossecução do empreendimento de colonização de Angola na parte sul, que a sua designação e o nome do comandante das forças portuguesas vencedoras, sempre constaram da toponímia da capital de Angola. O desfecho desse bastante lúgubre conflito fez desmoronar a autoridade em grande parte da África Central e Austral, converteu subsequentemente essa parte do planeta numa espécie de res nullius, deixou uma parte da humanidade desamparada de um Poder Central indutor do desenvolvimento, fez resvalar para uma agonia protraída os padrões de vida dos povos que estiveram entre as pioneiras na construção da amizade entre portugueses e nativos, cristianização e instrução do continente, determinou, um pouco mais de dois séculos depois, o assalto à região da maioria das Nações reunidas na Conferência de Berlim sobre África (em rigor deveria chamar-se, Conferência de Berlim sobre o Congo) e ainda determina o subdesenvolvimento e o caos que grassa nos tempos hodiernos na África Central e Austral.
Epílogo
A aspiração dos povos à fruírem do direito de ajuizarem ao que mais convém à sua realidade e ao seu porvir é irrenunciável e sempre foi motivo bastante para merecer todos os sacrifícios. Nenhum Povo pode ser permanentemente coagido a pertencer a um conjunto no qual está cronicamente material e imaterialmente prejudicado, quando melhor pode viver dele dissociado. Justamente por isso, o hospitaleiro Povo Português, mundialmente conhecido, reconhecido e celebrado como heróis do mar, nobre povo, Nação valente e imortal, resgatou esse direito de Castela, com cujo povo partilha muitas intercessões genotípicas, fenotípicas e históricas, no dia 01 de dezembro de 1640, restaurando a sua Independência e lutando por ela no conflito injustamente imposto aos Portugueses nos 28 anos subsequentes. Esses valores da humanidade estiveram igualmente subjacentes no espírito dos dignatários e defensores do Congo na Batalha de Ambuíla, provavelmente também o estivesse no espírito dos reis portugueses D. João II, D. Manuel I e D. João III, que inauguraram e promoveram relações virtuosas com os seus contemporâneos do Congo. E foi o mesmo sentimento que impeliu a participação das centenas de homens na reunião conspirativa realizada na gruta dos arredores da aldeia do Inga do município de Ambuíla em Março de 1961, embora tenha havido a deplorar muitas das acções das partes em conflito que o consubstanciaram e a que o 25 de Abril, com o sentido de inadiável pertinência dos capitães que o protagonizaram em Portugal, puseram fim, porquanto já era mais do que extemporâneo para Portugal, uma Nação com nove séculos de História, prosseguir essa quimérica realidade e como melhor o denunciou o poeta Manuel Alegre, na quinta As singelas reflexões que acabamos de apresentar a Vossas excelências, pretendemos que sejam entendidas como uma advocacia da necessidade de cuidarmos como activos, os muitos valores virtuosos legados pela longa e coagida jornada comum no passado, pletóricos também de momentos colisivos, resultantes talvez menos dos defeitos dos homens e mais dos tempos, pugnando em esculpir o presente e o futuro lembrados mas não condicionados pelo passado, em plena comunhão de pensamento e actuação com as indicações dos nossos virtuosos líderes, e sempre recordados que, por se manifestar invariavelmente no presente e no futuro, a História é uma grande parábola.essência da sua criação poética com o título Nambuangongo, meu amor:
Em Nambuangongo tu não viste nada Não viste nada nesse dia longo longo A cabeça cortada E a flor bombardeada Não tu não viste nada em Nambuangongo
Falavas de Hiroxima tu que não viste Em cada homem um morto que não morre Sim nós sabemos Hiroxima é triste Mas ouve em Nambuangongo existe Em cada homem um rio que não corre
Em Nambuangongo o tempo cabe num minuto Em Nambuangongo a gente lembra a gente esquece Em Nambuangongo olhei a morte e fique nu. Tu Não sabes mas eu digo-te: dói muito Em Nambuangongo há gente que apodrece
Em Nambuangongo a gente pensa que não volta Cada carta é um adeus em cada carta se morre Cada carta é um silêncio e uma revolta Em Lisboa na mesma isto é a vida corre E em Nambuangongo a gente pensa que não volta
É justo que me fales de Hiroxima Porém tu nada sabes deste tempo longo longo Tempo exactamente em cima Do nosso tempo. Ai tempo onde a palavra vida rima Com a palavra morte em Nambuangongo.
As singelas reflexões que acabamos de apresentar a Vossas excelências, pretendemos que sejam entendidas como uma advocacia da necessidade de cuidarmos como activos, os muitos valores virtuosos legados pela longa e coagida jornada comum no passado, pletóricos também de momentos colisivos, resultantes talvez menos dos defeitos dos homens e mais dos tempos, pugnando em esculpir o presente e o futuro lembrados mas não condicionados pelo passado, em plena comunhão de pensamento e actuação com as indicações dos nossos virtuosos líderes, e sempre recordados que, por se manifestar invariavelmente no presente e no futuro, a História é uma grande parábola.
A equipa técnica das editoras Alende (Angola) e Perfil Criativo (Portugal) felicitam todos os distinguidos pelo Prémio Nacional de Cultura e Artes, edição 2021, do Ministério da Cultura, Turismo e Ambiente.
O músico e compositor Filipe Mukenga foi distinguido na categoria de Música, a escritora e poetisa Amélia Dalomba na categoria de Literatura, Ana Silva na categoria de Artes visuais e Plásticas, Rogério Ferreira de Carvalho, na categoria de Teatro, Projecto “Benguela Street Dance”, dirigido pela coreógrafa Alda Lara, Afonso José Salgado Costa, na categoria de Cinema e Audiovisuais e a Associação Tchiweka de Documentação, na categoria de Investigação em Ciências Sociais e Humanas.
O corpo do júri do Prémio Nacional de Cultura e Artes, edição 2021 foi composto pelas seguintes personalidades: Presidente – José Octávio Serra Vandúnem e vice-presidente Noelma d’Abreu, (categoria de investigação em ciências sociais e humanas), Abreu Paxe e António Quino (Literatura), Kiluanje Kia Henda e Paula Nascimento (Artes Visuais e Plásticas), Agnela Barros e José Teixeira (Teatro), Afonso António e Edson Macedo (Cinema e Audiovisuais), Eduardo Sambo e Mário Furtado (Música), Ana Clara Guerra Marques (Consultora para a Dança) e Adriano Mixinge (Secretário do PNCA).
O Prémio Nacional de Cultura e Artes foi instituído em 2000, com o propósito de galardoar criadores nas disciplinas de literatura, cinema e áudio visuais, artes plásticas, artes de espectáculos e investigação em ciência humanas e sociais.
Dentro do nosso trabalho destacamos o livro “Marítimos” (2ª edição, 2021) uma homenagem ao 46º aniversário da República de Angola e ao 67º aniversário da fundação do Clube Marítimo Africano (CMA). Esta edição especial inclui o CD “Canto Terceiro da Sereia: O Encanto”, música de Filipe Mukenga, e a publicação de um conjunto alargado de documentos em fac-símile do arquivo Lúcio Lara da Associação Tchiweka de Documentação.
Últimos ultramarinos, uma grande parte nascidos em Angola, mas também por questões históricas conhecidos como “filhos de Ceuta“, marcaram encontro na Sociedade Histórica Independência de Portugal, a 17 de Novembro de 2021, no largo de São Domingos, em Lisboa, numa sessão-debate sobre o livro “Ceuta, Primeira Conquista de Portugal Além-Mar” (ed. 2015), do jornalista Xavier de Figueiredo.
A apresentação da obra foi realizada pelo Dr. Diogo Lacerda Machado, que referiu que Portugal estando bloqueado no acesso à Europa foi empurrado para o mar, isto é, para Sul e Ocidente, tendo sido há 600 anos em Ceuta a chegada de Portugal ao continente Africano. Advogado, administrador de várias empresas e homem de confiança de António Costa, Diogo Lacerda Machado foi a arma secreta do primeiro-ministro sempre que teve um imbróglio para resolver (segundo a revista Visão), e nesse papel confidenciou à plateia que o então presidente da câmara de Lisboa e mais tarde primeiro-ministro não teve capacidade intelectual para comemorar este sexto centenário e desta forma abrir pontes para um novo relacionamento com a monarquia constitucional de Marrocos, um dos mais potentes países Africanos, que regista um elevado índice de desenvolvimento humano. No final o Dr. Diogo Lacerda Machado indicou que Portugal (Europeu) é do tamanho da Catalunha e deixou no ar duas perguntas: será que Portugal sem Ceuta ainda existiria? E a língua portuguesa?
O presidente da Sociedade Histórica Independência de Portugal, Dr. Ribeiro e Castro, e o autor da obra apresentada, Xavier de Figueiredo, aproveitaram para enaltecer a presença do ilustre investigador angolano de História, Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel, valorizaram a sua monumental obra recentemente publicada, e elevaram as relações entre os dois países ao mais alto nível.
No final da sessão houve uma sessão de autógrafos e o presidente desta histórica sociedade revelou, a alguns dos presentes, a sala de reunião dos quarenta conjurados, que como se sabe destituíram com sucesso os Habsburgos, e proclamaram e aclamaram um rei português.
17 de Novembro de 2021 — O Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel foi recebido pelo Prof. Eng. Luís Aires-Barros, presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa para entrega oficial da sua monumental obra sobre a História de Angola, publicada em três volumes com o título “Angola: desde antes da sua criação pelos portugueses até ao êxodo destes por nossa criação” (edição 2021).
O autor agradeceu a oportunidade de ter consultado milhares de documentos e mapas preservados nesta instituição, referindo o especial empenho do senhor secretário perpétuo da SGL, Prof. Doutor António Pereira Neto, todos os técnicos envolvidos na gestão do arquivo e em especial a Dr.ª Helena Grego responsável pela biblioteca.
Sobre esta histórica instituição o Prof. Eng. Luís Aires-Barros referiu que “dentro das paredes da Sociedade de Geografia de Lisboa (SGL) guarda-se, ao lado do património imaterial das ideias de Luciano Cordeiro e de Ernesto de Vasconcelos, seus primeiros secretários gerais e dos vários presidentes de António Augusto de Aguiar, a Bernardino Machado ou de Adriano Moreira a Sousa Leitão que a dirigiram firme e sabiamente, um riquíssimo espólio material, logo representado pelos cadernos de campo e demais documentação manuscrita de Serpa Pinto, Roberto Ivens, Hermenegildo Capelo, Henrique de Carvalho, Silva Porto e Gago Coutinho, entre outros.
É todo este património cultural que procuramos estudar, preservar, manter vivo, valorizar.”
Já a Doutora Manuela Cantinho, directora do Museu Sociedade de Geografia de Lisboa, revelou um conhecimento muito pormenorizado sobre Angola e papel dos antigos investigadores do território.
Foi também revelado que há muito pouco tempo esteve uma missão militar de Angola na SGL para obter provas documentais sobre uma parte da fronteira que estaria em disputa com um país vizinho. Mostrando desta forma a importância do trabalho de levantamento cartográfico realizado no século XIX e a sua preservação em arquivo.
No final da sessão o Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel recebeu uma mensagem muito positiva para Angola que irá transmitir aos mais altos representantes da República. A visita a esta prestigiada instituição terminou com a visita ao museu e em especial à sala dos “padrões”.
Sobre o Museu
O Museu da Sociedade de Geografia de Lisboa abriu pela primeira vez as suas portas ao público em 1884. Criado com uma ênfase colonial integrou desde o primeiro momento a componente etnográfica. Em 1892 as colecções do então Museu Colonial de Lisboa, até aí sob a tutela da Secretaria de Estado da Marinha e Ultramar, foram incorporadas no Museu que a SGL estava a desenvolver desde 1875.
Ao longo dos cerca de 140 anos de existência o Museu tem vindo a enriquecer as suas colecções, embora o período entre 1875 e 1900 deva ser destacado como um dos mais importantes. Este caracterizou-se por uma política de aquisições, com contextos de recolha diversificados: de missionários, comerciantes, exploradores, militares ou ainda no âmbito das exposições internacionais dos meados e finais de Oitocentos. Colecções que traduzem de uma forma significativa a presença portuguesa em zonas tão diversas como Angola, Moçambique, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Timor e Macau. De entre o valioso acervo museológico destacamos, entre outras, as colecções Henrique de Carvalho, César Augusto Gomes Ribeiro e Pereira Marques, ou ainda conjuntos artefactuais de diversos grupos culturais: Chokwé, Luba, Kongo, Tsonga ou Bijagó. O Museu detém no seu acervo um grande número de objectos de arte – mobiliário, pintura, escultura, painéis de azulejos e vitrais – assim como, alguns instrumentos científicos, espólios de militares, exploradores e sertanejos.
Após a constituição em 1871 do primeiro império alemão sob o impulso do Chanceler Otto von Bismark e do imperador Guilherme I, este estado tratou de gerar acomodação em África, criando a África Alemã ocidental (Deutsch – Westafrika), representada atualmente pelos Estados pós-coloniais do Togo e dos Camarões, a África Alemã Oriental (Deutsch – Ostafrika) convertida actualmente no Tanganika, Ruanda e Burundi e, finalmente, o Sudoeste Aficano (Suedwest – AfriKa), que é a atual Namíbia. Os outros Estados atuais da África Central e Austral foram consignados à França, Bélgica, Portugal e Inglaterra, em processos negociais bilaterais que se realizaram entre si, sem participação dos Povos nativos nem consideração das suas realidades identitárias e aspirações. Este processo constitui o fundamento da existência dos Estados pós-coloniais modernos constituídos por múltiplos povos e tem reflexo na realidade política contemporânea em África, pelo que a Aula Aberta revisitará a Conferência de Berlim sobre África e os seus efeitos correntes nas regiões central e austral do continente berço.
Aula magna com o Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel realizada a 5 de Novembro, pelas 14h00, no Auditório do Edifício 16 do campus de Gualtar. Esta sessão organizada foi pelo Doutoramento em Estudos Culturais, em parceria com o Seminário Permanente de Estudos Pós-colonial e o Seminário Permanente de Comunicação e Diversidade.
Áudio da aula magna na Universidade do Minho realizada a 5 de Novembro de 2021
Carlos Mariano Manuel é Professor Catedrático de Patologia, Investigador de História e Autor da História Geral de Angola (edição de 2021, três tomos e 2300 páginas). O facto de ter nascido no epicentro da região em Angola onde a historiografia portuguesa marca o início do conflito do ultramar e o ulterior seu exercício em África e na Europa da prática e ciência de Hipócrates levaram-no a se interessar pela História de Angola e Contemporânea Gerais. Testemunhou a eclosão da insurreição geral de 1961 na sua cidade natal no norte de Angola, atos ocorridos entre 1983 -1986 no planalto central de Angola enquadrados no conflito fratricida pós-independência e a queda do Muro de Berlim em 9 de novembro de 1989, acontecimento que constituiu o epílogo do período da Guerra Fria e iniciou uma nova ordem política geral e em especial no continente africano. Frequentou como estudante livre na Universidade de Humboldt nos anos de 1992 – 1994 História Moderna e Contemporânea. Realizou conferências e publicou temas sobre História de Angola em Angola e em Portugal, que culminou com a publicação da obra acima citada.
Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel e a Prof. Doutora Rosa Cabecinhas
Prof. Doutora Rosa Cabecinhas, Dr. Kiluanje Liberdade e Prof. Doutor Carlos Mariano Manuel
11 de Novembro de 2021 – Integrada na exposição “Aqui é proibido falar!” no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa, foi apresentada com grande sucesso, e grande surpresa para o público que encheu o auditório, a peça “Antígona’19”, de Thiago Justino e Lina Paula Pinto, e que contou com a participação equipa do MNAA no coro. No final da peça houve um encontro entre os actores e equipa técnica e o público presente na sala.
Um espetáculo de Thiago Justino e Lina Paula Pinto, com Thiago Justino e elementos da equipa do MNAA.
Esta é uma Antígona inserida no século XXI, em plena pandemia, que vê os cidadãos sofrerem a injustiça exercida por um poder agressivo, ao serem enterrados num vala, sem cerimónias fúnebres.
Antígona sofre e sonha com um país onde o Humanismo pode manifestar-se em todo o seu esplendor, enquanto enfrenta a ira e a ironia de quem se impõe através de um poder avassalador e injusto.
Mesmo morrendo, Antígona marca a diferença pelas suas ações e pelos seus manifestos, pelos sonhos e pela vontade crescente de uma mudança que começa a nascer nas pontas dos seus dedos.
Informações e reservas: 214 001 788 | info@autores.club
Auditório do MNAA
Entrada paga limitada à capacidade da sala de acordo com as normas da DGS.