Os desafios económicos e empresariais de Angola em debate no ISCTE
Na tarde de ontem, dia 7 de janeiro de 2025, o Centro de Estudos Internacionais do ISCTE foi palco de um debate vibrante sobre os desafios económicos e empresariais de Angola no novo contexto estratégico internacional. O evento reuniu especialistas, académicos e interessados na dinâmica política e económica de um país que ocupa um lugar estratégico no tabuleiro global.
Renato Pereira, subdiretor do ISCTE Business School, abriu o encontro destacando o simbolismo do ano de 2025, que marca os 50 anos das independências dos países africanos de língua oficial portuguesa. Segundo ele, o objetivo é olhar para o futuro, ancorando as discussões nos avanços e desafios económicos enfrentados por Angola, num momento em que o país realinha as suas estratégias geopolíticas e procura fortalecer a sua presença no cenário global.
Uma Nova Aliança Internacional?
Com a recente aproximação entre Angola e os Estados Unidos, simbolizada pela visita de altos representantes norte-americanos e novos investimentos anunciados, o debate girou em torno do impacto desse reposicionamento na economia angolana. Para Jonuel Gonçalves, investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE, essa mudança reflete não apenas uma estratégia económica, mas também uma tentativa de Angola de se consolidar como um actor relevante na África Austral, num momento em que a competição por influência no continente está mais acirrada do que nunca.
“Angola é hoje um país com potencialidades enormes, mas ainda preso a desafios internos graves, como a desigualdade, a corrupção e a dependência de recursos naturais. A aproximação aos Estados Unidos traz novas possibilidades, mas também exige maior responsabilidade na gestão dos recursos e na inclusão social”, enfatizou Jonuel Gonçalves.
Contrastes Sociais e Políticos
Outro ponto forte do debate foi a dicotomia entre o prestígio internacional crescente de Angola e a sua realidade social alarmante. O país, que recentemente subiu no índice de desenvolvimento humano (IDH) e conquistou avanços no combate à corrupção, ainda enfrenta situações de pobreza extrema. Dados revelam que cerca de dois milhões de crianças estão fora do sistema educacional, e boa parte da população vive sem acesso a bens e serviços essenciais.
Maria João Teles Grilo, arquiteta e interveniente no debate, foi contundente: “Como é possível falar em um país estratégico no cenário mundial quando a sua população vive em condições tão precárias? Precisamos de soluções reais que impactem a vida das pessoas de forma directa.”
João Armando, director do jornal Expansão, destacou a questão da credibilidade da oposição em Angola, afirmando que “a oposição tradicional em Angola tem dificuldade em apresentar soluções concretas. Isto deixa um espaço vazio que muitas vezes é ocupado por setores informais” e deu como exemplo uma questão inconstitucional: “Quando a ministra Vera Daves fez um decreto a dizer que cada deputado só tinha direito a um carro a Assembleia Nacional achou que devia dar dois. Fizeram uma reunião entre eles, sem acesso à imprensa, onde aprovaram juntos, partido estado e oposição, a entrega de dois carros para cada deputado. Cada carro custou 280.000 dólares”.
Educação e Desenvolvimento Humano
Entre os participantes, ficou clara a necessidade de um foco maior em educação e desenvolvimento humano. A falta de qualificação profissional, aliada à fraca qualidade escolar e um sistema escolar que não é universal, foi apontada como um dos maiores entraves para o crescimento económico sustentável de Angola.
João Ricardo Rodrigues, editor da Perfil Criativo | AUTORES.club, ilustrou o problema com um dado preocupante: “Mesmo em sectores essenciais como o do petróleo, as empresas enfrentam dificuldades para encontrar profissionais qualificados que saibam escrever correctamente em português. Isso mostra que a República não fez o trabalho de casa e precisa de investir urgentemente na educação.”
Angola e o Mundo: Um Futuro de Possibilidades
Apesar dos desafios apresentados, os especialistas também apontaram oportunidades. A localização estratégica de Angola, as suas riquezas naturais e o crescente interesse de potências globais são factores que podem alavancar o país para um novo patamar de desenvolvimento.
“É necessário que Angola construa um projecto nacional claro, que alinhe os seus interesses económicos e sociais. Só assim poderemos falar em um futuro realmente promissor”, concluiu Renato Pereira.
O debate contou ainda com a contribuição da ilustre professora Inocência Mata, ensaísta e investigadora, que chamou a atenção para a normalização de condições precárias na sociedade angolana. Para ela, “a questão central é como fazer com que as pessoas falem do quotidiano e das condições reais das pessoas, em vez de se centrarem apenas em indicadores macroeconómicos”.
Por fim, Vitor Ramalho, político e antigo presidente da UCCLA, reforçou que “a solução para os desafios de Angola é antes de mais política. Enquanto não houver uma determinação forte nesse sentido, não haverá crescimento económico que resolva os problemas estruturais do país.”
Os participantes deixaram o ISCTE com uma certeza: o caminho para Angola é longo, mas também cheio de possibilidades. Este debate foi uma chamada à ação e um convite à reflexão sobre como construir um país mais justo e equilibrado, tanto interna quanto externamente.