Hamupipőke, Piroska és a Farkas (Romance)

Hamupipőke, Piroska és a Farkas (Romance)

Verdadeiro Amor Verdadeiro (Ed. 2020)

Rating: 3.5 out of 5.

ROMANCE

A vörös ruha (o vestido carmim)

Capítulo 1: Hugo Henriques

A reunião de Varsóvia marcou a interrupção dos trabalhos na cidade de Bucareste em finais de 2005, mas também o estabelecimento de medidas imediatas para o início de actividades em Budapeste. Era Novembro quando pegou no caderno que dizia Hungria, o segundo destino estratégico antes da República Checa, terceiro e último do plano.

Tinha passado quase uma década desde a última vez que entrara em Magyarország, mais precisamente na República da Hungria, Magyar Köztársaság.


Alojado no magnífico hotel Nemzeti da praça Blaha Lujza, distraía-se em grande parte do tempo livre, gastava a solidão por assim dizer, a descobrir os afazeres dos turistas vizinhos pela transparência das janelas dos quartos e casas de banho, tão próximas umas das outras, mas intercaladas por belas estátuas brancas sobre um fundo azul das fachadas ortogonais do pátio interior. O anoitecer trazia aos mesmos espaços representações diferentes: Para alguns apenas o sono vencia o cansaço, enquanto para outros o romantismo de Budapeste tornava oportuno o amor ardente.


De vez em quando jantava no hotel outras vezes fora, muitas delas no Alcatraz, um restaurante-bar decorado ao ínfimo pormenor como se fosse uma prisão, onde nunca falhava em pedir uma sopa de cebola dentro de um pão desmiolado.


Certa vez passeava a ver montras na Király utca, naqueles dias em que o vagar é aliado do tempo, quando descobriu o vestido carmíneo da loja Siptár, um motivo de fixação. Se coisa desta natureza é classificável como vício, então seja, porque sempre que calhava a caminho ou lá perto, muitos foram os dias de Dezembro em que esteve ali imóvel frente ao vidro a tentar imaginar uma face diferente para o manequim, uma outra bela que não adormecida e desejou tanto, tanto encontrar essa “Cinderela”.


O Natal aconteceu em Lisboa, e a passagem de ano no Porto. Regressou a Budapeste em Janeiro.

Hamupipőke, Piroska és a Farkas (Cinderela, Capuchinho vermelho e o Lobo)

Era Janeiro e nevava em Budapeste.


Desde o hotel Museum na Trefort utca (esquina com a Puskin utca) são apenas dois quarteirões de distância até à sopa de cebola.


Entrou no Alcatraz, e depositou imediatamente o sobretudo cinzento no guarda-roupa antes de descer as escadas e pedir mesa. Num Sábado à noite as reservas eram maiores do que os clientes presentes. Apesar disso argumentou com alguma insistência, mas foi infrutífero, abandonou a “prisão”, subiu e procurou o restaurante mais próximo, uma espécie de pub bávaro, mas com menu austríaco, o Bécsiszelet vendéglő, coisa de schnitzel para conduto e apfelstrudel para sobremesa, numa esquina da Dohany utca.


Comeu, pagou e marchou, mas sentiu o frio em maior dose do que a habitual quando deu conta de não ter o sobretudo, somente no bolso a ficha metálica com o número prensado do primeiro restaurante.


Uma prisão normalmente é local de pouca sorte, mas o Alcatraz estava animado por música ao vivo e foi precisamente “You`re the first, the last, my everything” o chamamento afortunado que o levou a adiar a recolha do sobretudo e descer para uma Kilkenny, que é menos amarga do que a Guiness mas também se pede em pints.


Encostado à barra e ao som do mesmo Barry White deu conta de um isolado par de almas fêmeas a terminarem o jantar em mesa ao centro, alheias à sua presença, ao mesmo tempo que uma rapariga vestida assim como um Capuchinho vermelho ou lá o que parecia aquilo, passava por detrás a promover a venda de rosas que transportava em cabaz de vime.
Diz que uma cajadada pode matar até duas coelhas, certo era bastar-lhe uma sempre que viva, encomendou as rosas ao “Capuchinho”, pré-pagou que nem um “Lobo bom” e assistiu regalado à entrega das flores, ajeitando o nó da gravata para salientar alguma compostura ao aceno.


Mal a jovem florista lhes apontou o doador, retribuíram ambas com sorrisos e não demorou muito para que “Just the way you are” num ápice o encorajasse a transformar o par em trio, no meio de um full house – apenas uma delas falava inglês e algo de francês a mais do húngaro – e sentou-se na mesa frente à dama que lhe faltava para completar a “sequência”.
Passadas umas semanas, essa mesma “Cinderela” provou diversos tamanhos do vestido de alças, mas foi precisamente o da montra, aquele que lhe serviu.

Az első találkozás (o primeiro encontro)


Trinta minutos antes da hora combinada já ele havia chegado ao largo junto ao parque de estacionamento da praça Blaha Lujza. Poucos metros de distância o separavam do restaurante onde se conheceram e fora ali a última vez que se tinham visto, por cautela de um e embaraço de outro, a falta de ousadia designou o mesmo local para o primeiro encontro, num Domingo às quatro da tarde.


O frio era suportado por debaixo do sobretudo, onde a gravata protegia a garganta, mas tentava uma compostura séria.
Pelo relevante atraso ela levantou a suspeita de que não apareceria, talvez tenha desistido, talvez tenha segredos e compromissos impeditivos, pensou.
Caminharam pela Nagy körút, nome pelo qual é conhecida a avenida que de quando em quando exibe nomes diferentes aos quarteirões, enquanto inventavam novos motivos para conversa, ele dá-lhe o braço e ela acompanha.


– Ali no Teatro Madách foi representado Az Operaház Fantomja em Dezembro passado, versão traduzida para a tua língua d’O Fantasma da Ópera… muito melhor do que The Phantom of the Opera, que conheci há dois anos em Londres.


Em ritmo veloz trocaram sabedoria e reconheceram-se as almas, quando à entrada do centro comercial West End na Nyugati pályaudvar já construíam esperanças sem certezas, estabeleceram-se preferências nos sabores das bolas do gelado e do café que é muito melhor se não misturado o leite, embora leite seja também muito bom, quando frio e achocolatado, assim por diante… e novamente ao jantar.


Sempre a pé, retornaram à praça Oktogon, subiram o passeio Andrássy para tornearem a estatuária dos reis e heróis, encontrando o espaço romântico do restaurante Robinson, desta vez com reserva marcada.
O primeiro passo, um momento audaz, foi o primeiro beijo na esplanada sobre o lago de água quente, testemunhado por alados de todas as espécies, depois do jantar.


Sorrisos e graça foram bastantes para as pegadas marcadas em estreia sobre a superfície branca de flocos de neve na Hősök tere, isto é, Praça dos Heróis, na direcção das escadarias da estação de metro Földalatti, onde se abraçaram e, sentido o calor contrastante das faces e o encosto das mãos sobre os relevos do corpo, ganharam certezas.


Conheceram-se apenas no dia anterior, mas tudo era tão breve que se sentiam ambos como numa amizade de longa data.


Acompanhou-a por fim até à praça Batthyány, já na margem de Buda, onde o seu estimado Honda Civic bordeaux estava parqueado, numa escuridão de noite já confirmada pelos projectores que iluminam a fachada do parlamento da Hungria, Országház, do outro lado do rio, mesmo em frente.
Beijaram-se novamente, nevava junto aos lábios.


Não por acaso ela reteve o seu cachecol, dormiu com ele, parece que cheirava bem, que a paixão se deixa alimentar por pormenores desta natureza.


A noite para ambos, mesmo à distância, foi passada em claro.


VERDADEIRO AMOR VERDADEIRO

Autor: Hugo Henriques

Editora: Criativo – Edições  

Ano de publicação: Dezembro de 2020, 1.ª edição

ISBN: 978-989-54937-4-6