“Os Lusíadas” em Crioulo

“Os Lusíadas” em Crioulo

Viagem de Vasco da Gama à Índia: 8 de Julho de 1497 a 20 de Maio de 1498

AUTOR: BRITO SEMEDO publicado na “Esquina do Tempo

Tradução em Crioulo, variante da ilha de Santo Antão, do Canto 5.º, Estâncias VIII e IX, d’ Os Lusíadas, datada de 1898, de autoria de um dos mais ilustres filhos dessa ilha, o Cónego A. da Costa Teixeira, que foi editor do Almanach Luso-Africano (S. Nicolau, 1895 e 1899) e da revista literária A Esperança (S. Nicolau, 1901) e autor da 1.ª cartilha caboverdiana: Cartilha Normal Portuguesa (Porto-Cabo Verde, 1902), destinado ao “Ensino primário completo“.

O texto está datado de 5 de Maio de 1898 e assinado com a indicação do autor ser “Caboverdiano”:

VIII

Depôs que nô passá quês îa Canária,

Q’otr’óra ês dá nôme de Furt’náde,      

Nó’ntrá tá navegá lá pa quês ága

Quês térra onde mute maravia nôve

Nosse navi de guêrra j’andá t’oiá:

Lá nô ribá c’um vintim favoréve

Pa nô t’mésse na quês térra mantmente.

IX

Nòs antrá na pôrte d’un d’aquês îa,

Q’tmá nôme d’aquêll guerrente’Sam Thiágue,

Sánte q’ajdá mute naçom spanhòl

Fazê n’aquês geste môr mute strágue

D’êi, q’ande soprá um vintim de Nôrte,

Nô torná t’má noss’camim socégáde

Na mêi d’aquêll mar, e assim nô bá d’xande

Quell’terra, onde nô ochá refrésque sabe.

 Cónego A. da Costa Teixeira, “Chegada ás Ilhas de Cabo-Verde”, Revista Portuguesa Colonial e Marítima, Lisboa, 1º Ano, 2º Semestre, 1897-1898, p. 566.

Foto Arquivo Histórico Nacional (IAHN), Praia


Canto V

Estância VII

Passamos o limite aonde chega

O Sol, que para o Norte os carros guia,

Onde jazem os povos a quem nega

O filho de Climene a cor do dia.

Aqui gentes estranhas lava e rega

Do negro Sanagá a corrente fria,

Onde o Cabo Arsinário o nome perde,

Chamando-se dos nossos Cabo Verde.

Estância VIII

Passadas tendo já as Canárias ilhas,

Que tiveram por nome Fortunadas,

Entramos, navegando, pelas filhas

Do velho Hespério, Hespérides chamadas;

Terras por onde novas maravilhas

Andaram vendo já nossas armadas.

Ali tomamos porto com bom vento,

Por tomarmos da terra mantimento

Estância IX

Aquela ilha apartamos, que tomou

O nome do guerreiro Santiago,

Santo que os Espanhóis tanto ajudou

A fazerem nos Mouros bravo estrago.

Daqui, tanto que Bóreas nos ventou,

Tornamos a cortar o imenso lago

Do salgado Oceano, e assim deixamos

A terra onde o refresco doce achamos.