Se, no século XVIII, o escritor francês Antoine Galland (1704–1717), encantou o mundo com a história das mil e uma noites, trezentos anos mais tarde, e pouco a pouco, é o angolano Maurício Francisco Caetano, “Mafrano” (1916-1982), quem encanta os seus leitores com o tesouro que também escondeu nos textos mágicos e maravilhosos que compõem hoje a sua colectânea póstuma sobre a ancestralidade da cultura Bantu.
De facto, com «Os Bantu na visão de Mafrano – Quase Memórias», antropologia cultural bantu, anunciada pela primeira vez em Abril de 2022, o mundo também descobre o significado mágico das palavras-chave utilizadas por Mafrano quando escreveu:
«Solicitado por um mundo de problemas cuja solução procura diligentemente encontrar, o homem devassa a terra, busca as profundidades abissais dos oceanos, atinge os espaços intersiderais, mas não tem a mesma solicitude para o mais interessante de todos os seus interesses que é ele mesmo e nisto reside, não raro, a génese de grande cópia dos seus infortúnios, das suas decepções, dos seus fracassos…».
Assim começa a colectânea «Os Bantu na visão de Mafrano», na página 19, do Volume I, retomando um texto que o autor escreveu em «A Hipótese de uma Escrita ideográfica no Bantu Ancestral», publicado no Jornal «O Apostolado», aos 6 de Fevereiro de 1971.
E foi com esta citação que, no dia 16 de Agosto de 2024, a Família de Mafrano desejou boas-vindas aos leitores desta colectânea unidos e reunidos na adorável cidade de Berlim, na Alemanha, e onde não faltaram ex-alunos que o autor teve em Luanda…
Se no artigo então publicado em 1971, Mafrano considerava a ANTROPOLOGIA CULTURAL como «ciência jovem que pretendia responder a três perguntas que a humanidade faz sobre o HOMEM, nos seus momentos lúcidos, pela maneira mais simples de agir e reagir, foi também com perguntas postas pelo autor, na sua época, que a família desvendou a CHAVE SECRETA para a abertura do tesouro escondido em mais de 700 páginas sobre a ancestralidade do HOMEM BANTU, compiladas quarenta anos depois da morte de Mafrano.
E tal como aconteceu na mitologia antiga do velho conto «Abre-te Sésamo», os leitores de Berlim também ouviram o grito «Abre-te, Mafrano» em:
(1) Quem são os Bantu?
(2) Donde vimos?, e;
(3) Para onde vamos?
Três perguntas-chaves curiosamente respondidas num painel conduzido por Hélio Maurício Caetano, neto; Luisíndia Walessa Caetano, neta, e por José Soares Caetano, filho, que dissertaram sobre os três temas seguintes:
(i) «Quem foi o cônego José Frotta, o tutor de Mafrano»;
(ii) «Mafrano e os valores universais da Cultura Bantu»; e,
(iii) «Mafrano e os principais desafios socio-antropológicos da sua época, entre 1934 e 1974)», sob moderação do Dr. Adlézio Agostinho que se encarregou de um resumo da vida e obra do autor, da apresentação dos dados biográficos dos três membros da família presentes e da mediação de um intenso e emocionante debate, durante mais de três horas.
No final, ficou-nos a ideia central da coragem, coerência intelectual e habilidade do autor que soube defender a cultura e a dignidade da civilização Bantu, em plena noite colonial, ao longo de uma carreira em que se notabilizou como funcionário público, professor, pedagogo, etnólogo e investigador.
Mafrano, disse a sua família em Berlim, defendeu o acesso universal à educação como um dos valores mais altos, ao escrever que a origem social e racial não poderia ser um factor de decisão na formação dos homens. Quis assim ele que o homem bantu discriminado e sem direitos cívicos fosse livre para ter acesso a conhecimentos que lhe permitisse ser Padre, Engenheiro, Advogado, Médico, etc.
Como acrescentou a família, Mafrano não se conteve com as três perguntas que formulou. Antes pelo contrário, abriu-se como «Sésamo» e mostrou ao mundo como estava atento ao que diziam consagrados autores internacionais, incluindo na própria Alemanha, sobre as ciências humanas, tais como Lehmann, que cita no preâmbulo da página 16; Victor Hensen (página 250, do Volume II); e, León Frobenius, que Mafrano nos apresenta como «o nome mais citado e estafado no estudo dos primórdios da pré-história da África», página 288 do Volume II.
Abrindo-se aos seus leitores, Maurício Caetano demonstra como observou e confrontou profundamente as suas fontes com cientistas autorizados entre os quais também incluiu o norte americano Franz Boas (1858-1942), pai da moderna antropologia cultural.
Em Berlim, ficou claro para todos como “Mafrano” se apoiou na cultura universal, incluindo fábulas e lendas por mais mágicas que fossem, para fazer os homens do seu tempo compreender o quanto era preciso educar «O BANTU DESCONHECIDO», a exemplo do homem do escritor francês Alexis Carrel (1873-1944), inculcando nele um elenco de valores que o fariam crescer intelectualmente e ser útil à sociedade! E isto, a despeito das ideias retrógradas, então dominantes sobre a suposta “inferioridade” dos indígenas, teoria que ele sempre rejeitou ao também escrever: «O NEGRO É BANTU NÃO É HOMEM DE COR», Volume I, página 185.
O momento em que os dois primeiros volumes da colectânea póstuma
«Os Bantu na visão de Mafrano», do escritor e etnólogo Maurício Caetano, eram oferecidos à Embaixadora de Angola em Berlim, Alemanha, numa cerimónia bastante concorrida que decorreu na última sexta-feira, dia 16 de Agosto.
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