24/02/2024 — Cinquenta anos após o 25 de Abril de 1974, o poeta António Manuel Monteiro Mendes apresentou o seu mais recente livro de poesia “Sul“, na Figueira da Foz. Terra que acolheu o autor como refugiado, em fuga à violência que escalou o processo de independência de Angola entre 1974 e 1975.
Álvaro Poeira é um pseudónimo de António Manuel Monteiro Mendes. O poeta nasceu no Mavoio, muito próximo de Maquela do Zombo e de Mbanza Kongo (São Salvador do Congo).
Na apresentação do livro “Sul” na Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, estiveram na mesa de honra para além do autor e do editor da Perfil Criativo, os antigos colegas São Simão, José Veríssimo e Carlos Santos, director deste estabelecimento de ensino. Os antigos colegas do liceu encheram a sala e levaram praticamente todos os exemplares disponíveis.
O autor, António Manuel Monteiro Mendes, e o editor da Perfil Criativo – Edições têm o gosto de convidar V. Ex.ª para a apresentação do livro “SUL“, de Álvaro Poeira, na Escola Secundária Dr. Joaquim de Carvalho, no Sábado, 24 de Fevereiro de 2024, às 15h00.
O Outro Lado da Poesia
Nasci entre paredes cobertas no Miombo,
numa casa muito simples de cor branca,
colocaram-me num cesto de verga em colchão
almofadado, num país de Vales Verdes,
Mandioca, Penhascos de Arenito, Imbondeiro, Múcua seu fruto inteiro.
*
Ali nascido, como diria mais tarde a poetisa,
“de eu te dar sem tu dares(…)
morre o florir de mil pomares(…)
*
Cresci sem ver as Rosas de porcelana,
fendas do Bimbe, o Morro Maluco
só vi de longe nas viagens
para Capunda-Cavilongo.
Nunca aspirei a brisa molhada
das Quedas de Kalandula nem vi,
na copa das árvores
o Macaco azul, nem as pedras
em Pungoandongo.
*
Ali crescido, ainda não lido, como escreveu
outro poeta, “não me deixes perder o que me é,
acrescento eu, que por amor do outro lado,
me foi dado”.
*
Depois, numa madrugada ou manhã,
de avião aterrei, num local onde meu pai e mãe
foram gerados, cada um em praias e rios,
montes e montanhas separados…
*
Me abraçaram sem culpa nos seus olhos e,
o poeta, de novo me deu alento, acenando-me que,
os meus pais o que queriam era um outro eu,
o do outro lado da poesia, dito agora sem alarde
ao senhor, “que por eles, sim,
vim decorar as águas dos seus rios com folhas
deste Continente, agora, meu outono
para sempre perturbado(…)
*
A Serra do Pingano, Rio Curoca, as halófitas,
Dunas brancas, Lírios d’agua da Lagoa
dos Arcos, a Palanca Negra Gigante, Golungo
e Boi-Cavalo, Zebra e Pacaças, que chegavam mortas,
Todos os textos são da autoria de António Manuel Monteiro Mendes, bem como os seus pseudónimos.
Nasceu em 1959. Numa pequena povoação no norte de Angola. Mavoio. Junto ao rio Tetelo. Filho de pais sem posses, mãe doméstica e pai serralheiro mecânico, viajou com eles e sua irmã, por Angola. Pouco tempo foi.
Em 1974, foi expulso da sua terra Natal.
Não conheceu a casa nem a terra onde a sua mãe o deu à luz. Veio como refugiado para Portugal. Quebrado.
Em estilhaços que ainda hoje tenta colar.
Tem três filhas de dois casamentos.
Viveu em tantas casas que só algumas retêm a sua memória.
Escreve desde sempre. Este é um pequeno grito de outros milhares que redigiu. Sabe, tem consciência que outros contos, lendas, prosas poéticas e poemas barafustar sob um Embondeiro,aclamando na sua justiça, pela identidade do autor, que aqui teriam lugar.
Não dá… Um dia, todas letras voarão por lá…
*Alberto Poeira e Álvaro Poeira, são pseudónimos de António Manuel Monteiro Mendes
Para responder a esta questão e para melhor percebermos as consequências das grandes transformações “macro” no universo “micro” de cada um de nós, o editor da Perfil Criativo e o poeta angolano, António Manuel Monteiro Mendes, têm o prazer de convidar V/ Excelência para o lançamento do livro SUL, de Álvaro Poeira, na Casa de Angola, em Lisboa, no próximo Sábado, 16 de Dezembro, às 16h00. Morada: Travessa da Fábrica das Sedas, nº 7, ao lado do Largo do Rato, em Lisboa
A apresentação e crítica do livro SUL estará a cargo de Paula Catarino, Victor Torres e do poeta angolano João Fernando André. A não perder!
Em jeito de balanço de fim de ano, recordamos que em 2023, publicámos catorze novos títulos, maioritariamente de autores angolanos, na sequência do trabalho editorial que temos estado a realizar desde 2015, já com um total de cento e oito títulos editados em Portugal.
Sem esquecer que este ano, vindo de Barcelona, publicámos também, na língua de Cervantes, o poeta, Danilo Facelli Fierro, autor com uma intervenção pública teatral e circense nas ruas da Catalunha, dando, desta forma, corpo à “Colección Aquelarre”.
Com a aproximação do fim do ano, a semana passada foi muito activa na divulgação dos nossos autores: realizámos dois lançamentos de novas obras.
Neste encontro, no Chiado, durante a apresentação da obra, o Prof. Doutor Guilherme D’Oliveira Martins voltou a confirmar uma realidade que temos denunciado em muitas das nossas actividades, em Portugal “conhece-se pouco a realidade de Angola”.
A confirmação desta realidade dá-se depois do nosso autor, investigador e professor catedrático, Carlos Mariano Manuel, Uina yo Nkuau Mbuta, um africano, bantu, mukongo, de nacionalidade angolana, ter recebido em Lisboa o Prémio Personalidade Lusófona 2023, atribuído pelo Movimento Internacional Lusófono.
Já o segundo livro, apresentado na Casa de Angola, a 7 de Dezembro, é uma obra aparentemente mais política, “EU E A UNITA”, do jornalista Orlando Castro, director adjunto do jornal Folha 8.
Neste encontro, o jornalista William Tonet referiu-se ao autor do livro como “incolor” e “os nossos brancos” ao grupo étnico caucasiano angolano. Segundo ele, este grupo define-se pelos que “foram encaminhados para a Arca de Noé da retornança, no processo de transição do Acordo do Alvor”, Identificando de uma forma muito objectiva a questão “racial” como sendo uma temática de grande fragilidade na construção da República.
No ar ficou a pergunta: o que é feito dos “nossos brancos”?
deitado, num livro pleno de frases sem hiena, leões, palancas, zebra, macaco, planta ou seca, mesmo sem pó…
Aiuê, aiuê, “tou” numa margem que
“tu não me vê…”
(…)
ÁLVARO POEIRA* in Minha Terra!
*Alberto Poeira e Álvaro Poeira, são pseudónimos de António Manuel Monteiro Mendes
António Manuel Monteiro Mendes
VICTOR TORRES**
Rua Paulo Inácio Guerreiro, na Sanzala dos Brancos, em frente ao Rádio Clube do Namibe, com um areal convidativo para umas futeboladas e umas corridas aos “papa-areia” que por lá andavam a debicar a semente do capim, os pequenos passaritos que sempre nos enganavam com os seus movimentos repentinos, esses movimentos que nos deveriam ter servido de antecipação ao fim de um sonho que só soubemos depois que era um sonho nunca sonhado nem imaginado, tal a inocência que nos assomava.
Foram assim os últimos tempos. Os que nunca julgámos que iam acontecer.
E que nos serviram para os outros tempos na terra dos outros. E que nos ensinaram a sobreviver na chamada civilização e a ter uma capacidade de resiliência, a que chamo mais de teimosia, que nos levou a vencer as dificuldades da vida material, mas não da espiritual ou a do sonho.
Porque esse ficou lá, na terra, no sítio onde nascemos, onde brincámos, onde nos formámos moralmente, sim, lá na nossa terra, a que temos cá dentro e a que nunca nos podem tirar do nosso sentimento, pois lá está por amor, é esse o segredo.
Entendo o teu recuo quando te digo: “vamos, vai ver o que sobrou de ti, vai olhar para a baía, para a praia, vai poetar o teu íntimo com o que os teus olhos vêem, abre-te, vai com o coração e deixa a incerteza fechada no teu bolso, não percas o que ainda podes fazer”.
Será que ias desconseguir? Será que ali, já não te saía a poesia de dor que te transporta, mas antes a alegria do amor escondido desde que chegaste à Tuga, como lhe chamávamos?
E o que farias? Será que te ias reencontrar neste retorno? Ou que ficarias de novo a vaguear feito Cazumbi?
Vamos só mesmo tratar dos nossos no nosso Kimbo e continuar a viver nos sonhos, agora que sabemos que podemos contorná-los e adaptá-los a nós.
É esse o nosso poder, o de transformarmos, a nosso favor, o que acharmos…
…e a nunca mais nos expulsarem, pois o que temos no coração não se rende.
Vamo só na Poeira do Alberto poeirando no quintal do jipe, felizes, ao sol, de cabelos compridos ao vento como se o amanhã não existisse.
Companheiro, uma boa jornada!
** In Prefácio do livro “SUL“. Victor Torres é autor do livro “Caraculo a minha paixão | Deserto de Moçâmedes (Namibe) | Álbum fotográfico do século XIX e XX” (Ed. 2020). Kamba do autor em menino.
Álvaro Poeira***
Todos os textos são da autoria de António Manuel Monteiro Mendes, bem como os seus pseudónimos.
Nasceu em 1959. Numa pequena povoação no norte de Angola. Mavoio. Junto ao rio Tetelo. Filho de pais sem posses, mãe doméstica e pai serralheiro mecânico, viajou com eles e sua irmã, por Angola. Pouco tempo foi.
Em 1974, foi expulso da sua terra Natal.
Não conheceu a casa nem a terra onde a sua mãe o deu à luz. Veio como refugiado para Portugal. Quebrado.
Em estilhaços que ainda hoje tenta colar.
Tem três filhas de dois casamentos.
Viveu em tantas casas que só algumas retêm a sua memória.
Escreve desde sempre. Este é um pequeno grito de outros milhares que redigiu. Sabe, tem consciência que outros contos, lendas, prosas poéticas e poemas barafustar sob um Embondeiro,aclamando na sua justiça, pela identidade do autor, que aqui teriam lugar.
Não dá… Um dia, todas letras voarão por lá…
*** Alberto Poeira e Álvaro Poeira, são pseudónimos de António Manuel Monteiro Mendes