Aniversário do lançamento de “Autores e Escritores de Angola”

Aniversário do lançamento de “Autores e Escritores de Angola”

Miguel Kiassekoka*: Alocução na apresentação da 1ª edição na sede da CPLP

Em primeiro lugar, os meus sinceros agradecimentos ao Tomás Lima Coelho, autor de “Autores e Escritores de Angola (1642-2015)”, obra de valor inestimável para a História e a cultura do espaço geográfico chamado Angola. Os meus agradecimentos estendem-se ao editor, aos outros apresentadores e a todos os presentes.
É uma honra e um privilégio participar neste acto simbólico: o lançamento de um livro destinado a perpetuar, na sua pluralidade e diversidade, a dimensão universal da cultura Angolana.
Propor-me falar dos 1.780 autores e escritores, incluindo o próprio autor, seria uma missão impossível. Assim, irei abordar esta obra de uma outra forma, pelo que peço a vossa benevolência.
Há anos, através de um escritor angolano, Tazuary Nkeita (José Soares Caetano), tive conhecimento do trabalho que o amigo Tomás Lima Coelho publicava e actualizava mensalmente na internet. Fiquei impressionado pela paciência, pela qualidade e volume do trabalho.
Transmiti ao Tomás a importância de publicar em papel a informação já recolhida na altura. A ideia foi aceite e o Tomás empenhou-se em concretizá-la. Mais uma vez, dou os meus parabéns ao autor por esta obra-prima, a primeira do género, que congrega todos os angolanos, independentemente da raça, credo politico ou religioso ou área de nascimento. 

Sede da CPLP em Lisboa, Setembro de 2016


O livro tem a particularidade de apresentar a Angolanidade, espalhada no mundo inteiro, desde 1642 aos nossos dias. Tomás Lima Coelho tem o mérito de  não fechar essa Angolanidade nos marcos de um incompreensível chauvinismo registado ultimamente,  ligado a um certo preconceito de “genuinidade” que tanto mal já provocou no continente berço, a nossa África.


O Tomás conseguiu manter o valor e a dimensão universal da Angolanidade nesta sua obra, o que a torna um manual indispensável para a formação das futuras gerações, construtoras  da consolidação da nossa Nação.
Neste universo globalizado, não há como sermos “genuínos” sem entrar em conflito com nós próprios e com o resto do mundo. Todos somos “mestiços culturais”, tendo conservado o que é originalmente nosso, enriquecido com o que vamos absovendo de outras culturas. Falo o português e outros idiomas, mas preservo o meu Kikongo; muitas vezes, expresso a minha emoção nessa minha língua materna, deixando confusos os que não a entendem.
A linguagem de Tomás é clara, ninguém corre o risco de se perder no grande manancial que representa esta sua obra; lê-se com muita facilidade e com uma certa ânsia de encontrar autores e escritores quer conhecidos, quer desconhecidos. É um livro que nos  leva a ter dificuldade em iniciar a leitura logo na primeira página,  pois corre-se à procura de nomes familiares.
Esta valiosa obra tem algumas imperfeições que edições posteriores vão, com certeza, limar. Encontrei a maioria dos autores e escritores de Angola, como o João Mantantu Dundulu, mais conhecido, no seio dos cristãos Baptistas, por “João Nlemvo”, que foi o primeiro a traduzir a Bíblia do grego e hebraico para Kikongo, e escreveu um dicionário Kikongo – Inglês. O doutor Américo Boavida, médico e herói da Luta de Libertação Nacional e patrono dos Trabalhadores da Saúde de Angola que celebram o seu dia  a 25 de Setembro, em sua homenagem. Cito apenas estes dois, para não provocar o ciúme de outros autores e escritores que conheço e que também me conhecem!
No meu conceito de Angolano e de Angolanidade, há um ilustre esquecido e a ausência do seu nome nesta antologia é notória, para os amantes da literatura angolana: Castro Soromenho. Embora nascido em Moçambique, teve uma plena vivência angolana, particularmente nas Lundas, que soube narrar de uma forma ímpar na sua trilogia: a Chaga, Viragem e Terra Morta, obras publicadas e vendidas pela UEA nos anos 80, republicadas pelo Ministério da Cultura de Angola para o segundo Festival Nacional da Cultura, e publicitadas pela TPA Internacional. Solicitei, pois, ao meu amigo Tomás, a correcção deste lapso na próxima edição, porque Castro Soromenho, exceptuando o seu país de nascimento, reúne todos os requisitos e sinais de Angolanidade para figurar nesta obra. 
O livro é lançado no mês em que celebramos, também, a vida e a obra do primeiro presidente de Angola independente, Dr. António Agostinho Neto, homem de cultura e, do meu ponto de vista, um dos melhores poetas da Angolanidade.  Neto usou o belo para consciencializar os seus contemporâneos sobre a situação colonial, tornando a poesia uma poderosa arma para a libertação dos Povos Africanos. É uma justa homenagem a este ilustre filho de Angola.
Pelo seu valor pedagógico, devemos empenhar-nos em que este livro seja incluído no sistema de ensino, para incentivar a investigação da nossa cultura e dos seus principais actores. 
Devemos, ainda, lançar o desafio da tradução desta obra noutras línguas nacionais, para a sua larga divulgação no seio da população angolana.
Autores e Escritores de Angola” representa um trabalho gigantesco, um decisivo e fundamental passo, dado pelo Tomás Lima Coelho em prol do conhecimento e preservação da literatura angolana. Esperamos, agora, que as instituições cumpram o papel que lhes compete, dando, efectivamente, o apoio necessário para a sua continuidade.

Muito obrigado pela atenção.
Lisboa, aos 22 de Novembro de 2016

  • Médico e editor, falecido em 2020

Nota do Autor (Tomás Lima Coelho): a menção feita ao escritor Castro Soromenho, pelo Dr. Miguel Kiassekoka, merece uma explicação sobre os critérios com que foi pensado e elaborado este trabalho. Esses critérios são dois: ter nascido em Angola (ou ter adquirido a nacionalidade angolana) e ter publicado pelo menos um livro. O escritor acima referido não cabe nestes critérios (nasceu em Moçambique e faleceu no Brasil antes de existir uma Angola independente), apesar da reconhecida angolanidade das suas obras, bem como as de tantos outros, dos quais cito apenas quatro nomes a título de exemplo: Alfredo Troni, José Redinha, Albano Neves e Sousa ou João Maria Vilanova. Sensível a este apelo, acrescentei, nesta nova edição, uma página final assinalando os nomes e obras de alguns autores “com Angola dentro”.